quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Troika Municipal


Esta proposta é alucinante,

Começo por ir à lei.
Propõe-se o governo “emprestar-nos” a juros, sendo que o fundo global para todos os municípios que se candidatem é de mil milhões de euros. Se este montante não chegar, a atribuição é feita por rateio.
Portanto, anotemos: vamos candidatar-nos a um “empréstimo” cujo montante final não conhecemos.

Se coloquei aspas na palavra “empréstimo” foi por uma simples razão.
As transferências do OE têm sido diminuídas nos últimos anos. E ficou a cargo do município muita despesa que era competência do Ministério da Educação. Ou seja, o governo propõe-se emprestar-nos agora a juros dinheiro que andaram a tirar-nos durante anos.
Mas, atenção, o governo não se limita a ir-nos ao bolso. Quer obrigar o município a fazer o mesmo aos munícipes.

A Lei estipula dois regimes. Um, o regime 1, mais draconiano, para os municípios em desequilíbrio estrutural para municípios como o nosso.
Só que basta falhar uma prestação do empréstimo, para imediatamente nos serem cortadas as transferências do OE.
Ora, quem é que é capaz de prever o que vai acontecer, num quadro recessivo, ao longo dos próximos 20 anos? Em rigor, alguém acredita que poderemos garantir o pagamento de tudo, mesmo tudo, como é obrigatório, sem falhar uma prestação ao longo de tantos anos?

O governo não acerta numa previsão económica e financeira a 14 meses. Nem a 14 dias.

Isto não é sério, é uma farsa, para obrigar os autarcas a sugar os munícipes até ao último cêntimo. Matéria em que este governo é exímio.

Admitamos que por milagre as previsões a longo prazo acertam. Ainda assim, mesmo certo é um conjunto de medidas que a lei impõe que vão pesar ainda mais na bolsa dos nossos munícipes.

As medidas propostas, para um horizonte de 20 anos, comprometerão 5 mandatos depois deste, a um ano de terminar. Cinco novos elencos camarários depois deste amarrados a um garrote financeiro que lhes retira autonomia de gestão e a sua liberdade para aplicarem as medidas que o eleitorado sufragar. Não se vislumbra o que tem esta autêntica operação de “tróika para as autarquias” a ver com autonomia do poder local e, no limite, com a própria democracia

A proposta que aqui nos é apresentada é, de resto, muito detalhada:
  • Previsão de aumento da receita do IMI em 30%
  • Diminuição de pessoal até “ao mínimo indispensável”
  • Concessão de uma das mais interessantes fontes de receita, o estacionamento
  • Condicionar o investimento a 900 mil euros até 2020, acrescendo 500 mil euros até 2032, estagnando o município por completo durante 20 anos.
  • O município pagará 1.100milhões de euros a cada semestre. E se falhar uma prestação?
Em caso de incumprimento de qualquer prestação (...) a DGAL procede à retenção da receita não consignada proveniente das transferências do Orçamento do Estado e a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) à retenção de outras receitas de natureza fiscal.
A Nazaré arrisca-se a ficar sem financiamento de tipo algum.

A proposta é alucinante porque sugere um empréstimo de 33 milhões de euros a pagar em 20 anos (Alcobaça, por exemplo pedirá 4 milhões a pagar em 14 anos). Será uma renda incomportável para a Nazaré e irá parar qualquer tipo de desenvolvimento.

Os serviços públicos prestados pelo município vão reduzir-se e degradar-se com a saída prevista de trabalhadores, durante 20 anos. Ou esses trabalhadores que vão aposentar-se serão total ou parcialmente substituídos por trabalho eventual, contratados, sem vínculo ou à peça - operações de terrorismo laboral em que os actuais governantes são, aliás, verdadeiros especialistas.

Algumas medidas positivas de redução de despesas não alteram a essência deste quadro.

Também é verdade que este “empréstimo” permitirá injectar alguma liquidez na economia local e resolverá problemas imediatos de tesouraria a pequenas empresas e a fornecedores locais. Mais esse é um alívio ilusório, um autêntico “beijo da morte”, pois a contracção e o aperto que se lhes seguirão - decorrentes do plano de medidas proposto - tornarão tudo ainda pior.

O que os municípios têm a fazer é exigir o aumento das transferências do OE e a reposição das verbas cortadas. Em conjunto e no âmbito da ANMP.
Ou, no mínimo, a concessão de empréstimos, ao juro de 1%, taxa a que o Estado o recebeu, mas sem as imposições gravíssimas e limitadoras da autonomia do poder local.

Provavelmente, este governo não o fará. Mais uma a comprovar que este governo já está a mais e com prazo de validade ultrapassado.

Obviamente, o Bloco de Esquerda não aprova esta operação.